quarta-feira, 18 de maio de 2011

Good intentions

- Pára Ambrósio!
O motorista firmou as mãos no volante e carregou com força no pedal de travão. Não era hábito o Sr. Doutor falar tão alto. Desde há anos que era conhecido nos tribunais por defender as suas causas de um modo controlado, mas mordaz, que lhe tinha trazido fama e fortuna. 
- Pára Ambrósio! Repetiu o advogado, num tom mais suave, agora que se apercebia que o seu motorista de há mais de 10 anos ia cumprir as suas ordens. 
O carro, um Mercedes preto, imobilizou-se. Ambrósio pousou o olhar nas árvores da beira da estrada, ondulantes pelo vento, recortadas contra o céu violeta e ficou em silêncio.
- Porque é que aquele homem está a comer erva na beira da estrada? Perguntou o advogado.
Ambrósio fez um pequeno silêncio. A sua respiração pesada confundiu-se com um suspiro.
O advogado saiu do carro, sem esperar que Ambrósio lhe abrisse a porta, e dirigiu-se ao homem para lhe repetir a pergunta:
- Porque é que está a comer erva?
O homem endireitou-se e observou o advogado. Ficou muito sério. Os seus olhos pareciam agora húmidos. A sua voz balbuciou algo que o advogado teve alguma dificuldade em perceber:
- Sou muito pobre senhor. Não tenho mais nada para comer...
A expressão na cara do advogado traiu-o. Como era possível que este homem estivesse ali a comer erva, ali na beira da estrada? A revolta crescia dentro dele e foi sem surpresa que se ouviu dizer, já com a sua voz confiante de tribuno brilhante:
- Tu vens viver comigo para minha casa.
O pobre homem começou a chorar. 
- Mas eu tenho mulher e filhos. Estão ali à frente, a comer a erva daquele lado... - respondeu, entrecortando a sua voz com os soluços.
- Eles também vão viver connosco...
O pobre homem largou a correr e a gritar pela mulher e pelos dois filhos. Ambrósio esperava-os, sorridente, com a porta do carro aberta.
A família não encontrava palavras para agradecer ao advogado e, já no carro, o pobre homem haveria de lhe dizer:
- Muito obrigado por nos recolher em sua casa. É muita bondade da sua parte.
- Não precisam de agradecer. Vão gostar muito de minha casa e dos jardins. A relva está com uns dez centímetros de altura.









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